OUTRAS ESCRITAS

Chutando a escada

Ha-Joon Chang, economista vinculado à Universidade de Cambridge, Inglaterra, em entrevista ao diário espanhol El País: “A receita de austeridade usada na Grécia é a mesma tentada na América Latina, na África e em alguns países da Ásia nas décadas de 1980 e 1990, e que criou desastrosos resultados econômicos. Investir em política de austeridade é contraproducente. “

A entrevista foi publicada no longínquo janeiro de 2018, mas a cantilena da austeridade segue firme em 2021. É a máxima do mercado, reproduzida pelos especialistas em meios de comunicação hegemônicos. Chang abordava, então, a agressiva política de desindustrialização pela qual passava o Brasil, em sua visão caminho certo para o atraso. A desindustrialização, como se sabe, acentuou-se desde então.

Dizia ainda o economista: “O que é incrível é que essa política vem sendo usada várias vezes, como no Brasil nas décadas de 1980 e 1990, e nunca funcionou. Albert Einstein falava que a definição de loucura é fazer a mesma coisa várias vezes e esperar resultados diferentes. O problema é que muitos economistas que defendem essas medidas, quando sua teoria não funciona, culpam a realidade. Como se a teoria nunca estivesse errada.”

Chang é autor de vários livros, entre eles “Chutando a escada – a estratégia de desenvolvimento em perspectiva histórica”. No livro, ele indaga como os países ricos enriqueceram de fato. E responde: com protecionismo, subsídio estatal, incentivos à produção local.

Conclui-se, portanto, que enriqueceram com políticas contrárias ao tal livre mercado que, dizem os ricos, devem ser adotadas pelos países não desenvolvidos ou – vá lá – emergentes.

Da prática britânica ainda no século XVIII de incentivo à produção primária nas colônias – em vez da manufatura de produtos concorrentes – ao Consenso de Washington do final dos anos 1980, que recomendava privatizações, livre trânsito de capitais, corte de gastos públicos, enfim, dois séculos depois com medidas aqui ou acolá disfarçadas, mas sem que se alterem as intenções daqueles que as recomendam.

Assim, conclui Chang: os ricos empurram a escada que utilizaram para chegar ao topo. Afinal, por que deixá-la disponível?

A obra é atual. Leitura importante.

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