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Levantado do Chão

Levantado do Chão, livro de José Saramago do final dos anos 1970, passado quase meio século segue atual. No romance, o escritor narra saga de trabalhadores, sempre miseráveis, sujeitos aos coronéis de latifúndios, gente de fato escravizada, mesmo sem lei que impusesse a escravidão no Alentejo, Portugal. Ambientada no antigo colonizador, cabe perfeitamente nestas terras colonizadas.

Escreve Saramago:

“Depois da terra, a primeira coisa de que Lamberto (um latifundiário) precisa é de um feitor. O feitor é o chicote que mete ordem na canzoada. É um cão escolhido entre os cães para morder os cães (…)”

E segue escrevendo, como se estivesse falando:

“A grande e decisiva arma é a ignorância. É bom que eles nada saibam. Nem ler, nem escrever, nem contar, nem pensar, que considerem e aceitem que o mundo não pode ser mudado, que este mundo é o único possível, tal como está, que só depois de morrer haverá paraíso, o padre Agamedes que explique isso melhor, e que só o trabalho dá dignidade e dinheiro, porém não têm que achar que eu ganho mais que eles, a terra é minha, quando chega o dia de pagar impostos e contribuições, não é a eles que vou pedir dinheiro emprestado, que aliás sempre foi assim, e será, se não for eu a dar-lhes o trabalho, quem o dará, eu e eles, eu que sou a terra, eles que o trabalho são, o que for bom para mim, bom para eles é, foi Deus que quis assim as coisas, o padre Agamades que explique melhor, em palavras simples que não façam mais confusão à confusão que têm na cabeça, e se o padre não for suficiente pede-se aí à guarda que dê um passeio a cavalo pelas aldeias, só a mostrar-se, é um recado que eles entendem sem dificuldades. Mas, diga-me senhora mãe, bate também a guarda nos donos do latifúndio, Credo, que esta criança não regula bem da cabeça, onde é que tal se viu, a guarda, meu filho, foi criada e sustentada para bater no povo (…) O povo fez-se para viver sujo e esfomeado”

Saramago: indispensável.

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