COISAS DE AGORADESTAQUE

Vítima das vítimas

O domingo 7 de janeiro marca três meses de incessantes ataques do Estado de Israel à Faixa de Gaza. O morticínio de agora é, em verdade, nova investida sionista para a tomada de terras e eliminação de palestinos, coisa que ali se promove há pelo menos 75 anos. Na expressão do Ilan Pappé, historiador israelense de família judia, trata-se de um processo de limpeza étnica, conceito definido como um crime contra a humanidade. A sentença se repete em todas essas décadas: ‘palestinos, deixem suas casas ou morram’.

Números da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgados por agências de notícias internacionais: desde 7 de outubro, 22 mil mortos na Faixa de Gaza, dos quais 10 mil crianças. Ao menos 1.9 milhão de palestinos forçados a deixar suas casas para fugir dos ataques israelenses. Dos 2,2 milhões de habitantes da Faixa de Gaza, metade corre o risco iminente de morrer de fome. Escolas, hospitais, padarias, mesquitas, casas: enfim, tudo bombardeado indistintamente.

Ainda em outubro, o ministro da Defesa israelense, Yoav Gaallant, declarou cerco completo a Gaza, com corte do fornecimento de eletricidade, comida e combustível – itens essenciais cuja oferta é controlada por Israel na região. Em 31 de dezembro, o ministro das finanças de Israel e integrante do Partido Religioso Sionista, Bezalel Smotrich, apresentou proposta para “repovoamento da Faixa de Gaza”. Para Smotrich, em entrevista ao jornal israelense Haaretz, destacada pelo portal Opera Mundi, “se houver 100 mil ou 200 mil árabes (em Gaza), em vez de dois milhões, tudo seria diferente (na relação entre Israel e o território palestino). Para controlar militarmente o território ao longo do tempo, também é necessário ter uma presença civil”. E acrescenta: “a maior parte da sociedade israelense dirá: ‘por que não? É um lugar lindo, vamos fazer o deserto florescer”. O ministro inclui, em sua proposta, campanha destinada a encorajar a imigração de israelenses para o território.

Vítima das vítimas

Em seu livro “A Questão da Palestina” (Editora Unesp, 2012), o escritor Edward W. Said narra a discriminação a palestinos promovida ou tolerada em muitos países, especialmente Estados Unidos da América, país principal fornecedor de armas ao exército israelense.

Said destaca que sionistas tentam se vitimizar, rotulando antissionistas de antissemitas, desprezando até mesmo o fato de que há inúmeros judeus, incluindo aqueles de algumas vertentes religiosas, que são antissionistas.

Ao lembrar do extermínio de milhões de judeus pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o escritor menciona a tão grande quanto ignorada assimetria entre, de um lado, palestinos, povo discriminado, desfavorecido e injustiçado e, de outro, Israel como “Estado do povo Judeu”, instrumento direto do sofrimento palestino. Diz ele: “há uma ironia complexa: as vítimas clássicas dos anos de perseguição antissemita e do Holocausto tornaram-se, em sua própria nação, carrascos de outro povo, que passou a ser, portanto, vítima das vítimas”.

Países em assembleias na ONU aprovaram recentemente resoluções pelo cessar-fogo, como ao longo de anos vêm aprovando resoluções reconhecendo o direito de palestinos a constituírem seu próprio estado em suas terras. Não há, no entanto, quem faça essas resoluções prosperarem.

Leia mais em:

https://todoplural.com.br/2023/12/13/contra-o-sionismo-nada-contra-judeus-por-uma-palestina-laica-e-soberana/ e

https://todoplural.com.br/2023/10/19/a-limpeza-etnica-da-palestina/

You may also like

Leave a reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *