No Brasil do Banco Central independente, o governo eleito pelo voto popular pode menos que o presidente da autarquia indicado pelo governo anterior, derrotado em sua tentativa de reeleição. A ver até quando.
Reunião de ontem (29) do Conselho Monetário Nacional (CMN) manteve a meta de inflação para 2024, 2025 e 2026 em 3% ao ano, com tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. Alterada, apenas, a periodicidade de avaliação da inflação frente à meta. A partir de 2025, desconsidera-se a referência do próprio ano e adota-se o critério de acompanhamento contínuo, segundo anúncio do Ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Da reunião, não há até agora qualquer informe quanto ao pleito do Deputado Federal Lindbergh Farias (PT-RJ) ao CMN, protocolado em 22 de junho, para que o órgão encaminhe ao Senado Federal pedido de afastamento do presidente do Banco Central do Brasil (BC), Roberto Campos Neto, por, argumenta o deputado, descumprimento de objetivos do banco. Campos Neto, indicado em 2021 por Jair Bolsonaro quando da aprovação de lei de autonomia do Banco Central, tem mandato até 2024. Não pode ser exonerado por medida do Poder Executivo. Integram o CMN, além do Ministro da Fazenda e do Presidente do Banco Central, a Ministra do Planejamento, Simone Tebet.
Regime de metas de inflação
O regime de metas de inflação foi instituído no Brasil em 1999, primeiro ano do segundo governo Fernando Henrique Cardoso. Crise econômica de então e a acentuada desvalorização do Real frente ao dólar foram argumentos para tanto. A meta de inflação é parâmetro para a política monetária. Inflação acima da meta exige, observado esse regime, a elevação da taxa básica de juros (Selic). Taxa elevada, como a atualmente determinada pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central, restringe operações de crédito, financiamento e o consumo, afeta a indústria, comércio e o emprego. Espera-se, com isso, retração econômica e queda de preços.
O economista Paulo Nogueira Batista Jr., ex-diretor-executivo no FMI pelo Brasil e mais dez países, avalia em seu artigo “Dogmas monetários renitentes” (Carta Capital, edição 1266), que a “autonomia legal do BC e o regime de metas de inflação são políticas reverenciadas entre nós, mas muito discutíveis, para dizer o mínimo (…) A ortodoxia nacional aferra-se a esses dogmas, muito embora seu declínio já se faça sentir nos países desenvolvidos, onde tiveram origem”.
Em relação ao Banco Central, diz ainda Batista Jr. que “o BC é, sempre e em toda parte, um braço do aparato estatal”. BC independente, de fato, torna-se um “estorvo para a política econômica. Isso raramente acontece – o caso brasileiro de 2023 é um exemplo entre poucos”.