Bem-vindo 2021, quem sabe um ano melhor. Boas festas com os cuidados necessários, embora mostrem-se insuficientes.
Do que a memória revela, 2020, encenação iniciada em 2015, foi o mais longo dos anos recentes. A pandemia é sua marca no país que, com menos de 3% da população mundial, empilha quase 15% dos cadáveres de vítimas da Covid-19 no planeta. Vacina? Na palavra sempre mutante do Presidente da República, não foi adquirida ora por de não ser confiável, ora por não ter sido oferecida por laboratórios. Afinal, quem quer vender procura o cliente!
Mas a pandemia se presta, também, a disfarçar o fruto da boiada passada sob o berrante Federal: mais reformas definitivas, mais desempregados, mais armas e mortes punindo cidadãos por sua cor, gênero, por sua natureza; menos florestas, pantanais, previdência, menos direitos. Tudo, aqui, por conta das ideias dos que dominam e, portanto, fazem de suas ideias as dominantes.
Há muito, cidadãos se abrigam em ruas e filas do emergencial transitório, carregam sacolas com balas e chocolates em trens e semáforos. Nem todos os veem, é verdade: há banqueiro que, consternado, descobriu recentemente que no Brasil existem pessoas que se sustentam e moram em lixões!
Olhando o país, por vezes necessário lembrar aquela que pariu curuminha, personagem da Ópera do Malandro, de Chico Buarque de Holanda, ao cantar “se fosse permitido, eu revertia o tempo”.
Ela queria recolher de volta a sua cria, pelo cordão perdido, à escuridão do ventre. A cria de agora não faz jus nem mesmo à canção desnaturada, nem mesmo ao abrigo da volta.
Alguns talvez desejassem, se permitido, reverter o tempo. Confessam ter acreditado por ingenuidade ou ignorância em processo que legou ao Brasil a direção que aí está. Outros, nem ingênuos nem ignorantes, não desejam reverter nada, por mais que digam assim desejar.
O legado foi gerado sob a fraude. Democracia não se faz apenas com voto. Mas há de se recordar que a fraude foi legitimada por aqueles que, embora a denunciassem, dela participaram. Não faltaram nem mesmo os telefonemas de congratulações e desejos de boa gestão.
Como mencionado no início, bem-vindo 2021, ao menos para pôr fim a 2020.
E para nos dar esperança. Lutaremos.